terça-feira, 29 de maio de 2012

Dona Tudinha, amiga e costureira de mão cheia

29.05.2012


O meu conhecimento com dona Tudinha se deu através da amizade que existia entre ela e dona Maria (minha sogra), vizinhas de longas datas. Quando namorava Daniel fui apresentada para ela, que bem simpática, teceu alguns elogios sobre mim e perguntou o nome dos meus pais. Quando falei o nome do meu pai, a alegria estampou-se em seu rosto e disse: “Você é filha de Lulu? ... Ele foi muito meu amigo, pessoa de coração grande, gostava de fazer caridade, de ajudar aos necessitados e de tratar cordialmente às pessoas, dizendo: Saúde e paz! Que pena, ele morreu muito novo”. E daí surgiu a nossa amizade. Sempre que ia para a casa de Daniel a encontrava, algumas vezes na porta, outras sentada na calçada, e muitas outras vezes passava em frente à sua casa e a porta  encontrava-se fechada. Esse era o sinal de que estava trabalhando. E o seu trabalho era o de confeccionar camisa e calça para homens. Diplomou-se em corte e costura, e assumiu a sua profissão com tanto amor, com tanta dedicação que sua clientela crescia cada dia. Ela não gostava de dizer NÃO para os seus inúmeros clientes, mas quando não tinha condições de entregar no prazo solicitado, para não ser irresponsável não recebia a encomenda. Para ser mais exata, no dia marcado o vestuário estava pronto, passado, já no jeito de ser usado. Gostava muito de conversar, de assistir missa na Capela do Socorro e de cultivar boas amizades. Falava sobre minha tia Laura, irmã de meu pai, uma grande amiga sua. Quando meus filhos nasceram ela se tornou a costureira deles. O primeiro boné usado por Michel e por Daniel Junior foram criações suas. Macacões de vários modelos, bermudas, calções, camisas, conjuntos Safari, um guarda roupa completo de novidades, uma verdadeira expert no que executava com tanto prazer, que quando finalizava o trabalho estendia-o em sua frente e ficava admirando sua obra. Recordo que quando ela marcava o dia de entregar as roupas dos meninos, em sua casa não existia ainda cigarra e tinha que chamar, e quando ela não escutava devido ao barulho da máquina, eu batia no vidro da porta, dizendo: “Dona Tudinha, é Neuma”. Ela respondia e pedia que entrasse e acrescentava: “Tô já terminando, sente um pouco, já estou passando para lhe entregar”. E eu respondia assim: “Não se incomode em passar, sempre amassa, deixe que passo em casa”. Mas, sempre muito correta, não aceitava a minha sugestão e ainda embrulhava em papel de embrulho, naquela época não existia sacolas de plástico. Quando saía de sua casa carregada de embrulhos, sorria feliz imaginando como meus filhos ficariam alinhados com os modelos confeccionados por ela. E foi assim por um bom tempo que dona Tudinha costurou para eles, deixando quando eles já crescidos porque optaram por camisas de malha e calça jeans. Coincidiu também com a época em que ela já estava se aposentando e deixava de costurar, passando a aproveitar a vida para viajar, conhecer novos horizontes, países estrangeiros e visitar os filhos que moram fora. Com setenta e sete anos, enfrentou uma longa viagem à Europa, numa excursão organizada por padre Murilo de Sá Barreto, para comemorar os cem anos da missa celebrada por Padre Cícero, em Roma, na Igreja de São Carlos Al Corso. A excursão percorreu cinco países; Portugal, Espanha, França, Suíça e Itália. Fiz parte dessa excursão e em nenhum momento vi dona Tudinha cansada, indisposta, renunciando a algum passeio ou pedindo para descansar. Participou de todo o roteiro, e olhem que não foi moleza, pois  foram percorridos 11.900km por terra, é muito chão. E a baixinha Tudinha, toda enfronhada com agasalhos e cachecóis, resistiu ao frio e não sentiu nem resfriado. Como foi maravilhosa essa caminhada de peregrinação, visitando igrejas, santuários, assistindo missas e pregações, o momento com o Papa. Para dona Tudinha decidir participar de uma excursão de temporada tão longa para uma pessoa da sua idade considero um ato de heroísmo. Relembro agora o local de sua residência, local privilegiado voltado para uma praça (José Sarney), com árvores, bancos para sentar com os amigos e  palestrar,  cumprimentar as pessoas que passam, e ainda, quando sozinha resolvia as incontáveis revistas de palavras cruzadas, prazer muito apreciado por ela. Em novembro do ano passado comemorou com familiares e amigos os seus noventas anos, num clima de alegria com a celebração da Eucaristia na Capela do Socorro e muita descontração em jantar oferecido e organizado por seus filhos. Ultimamente, essa fortaleza de mulher que sempre à tardinha nestes últimos tempos ficava sentadinha na frente de sua casa aguardando os amigos para conversar, não está mais com aquela disposição. A idade contribui para isso e também o coração que começa a falhar. Mas espero em breve vê-la novamente sentada na praça, saudando os amigos com aquele belo sorriso de meiguice. Dona Tudinha é viúva de seu Isaias Melo, uma das primeira pessoas a possuir e pilotar motocicleta em nossa cidade, tem quatro filhos  (Eliane e Socorro; Francisco e Raimundo). A dedicação e os cuidados com que seus filhos a assistem ultimamente é resultado do amor e abnegação que ela teve para com eles.   
Amostra de algumas roupas confeccionadas por Dona Tudinha

Dona Tudihnha  com sua máquina de costura; sua residência na Praça José Sarney e o banco onde costuma conversar com as amigas na mesma praça.

Na foto de cima, participando da Renovação do Sagrado Coração de Jesus na casa de sua amiga Maria Almeida,; na de baixo: um flagrante de sua viagem a Europa em excursão coordenada pelo padre Murilo.
 MENSAGENS RECEBIDAS:

Gostei demais de você ter publicado as histórias engraçadas de mamãe na sua coluna. Gostaria de acrescentar que mamãe, após o falecimento de papai, recebeu de vários amigos da Pracinha muitas manifestações de consolo, através de palavras de conforto e de conversas alegres acompanhadas de contação de piadas. Ela gravou na memória todas as piadas que lhe foram contadas e gostava de contar pra gente. Ela tinha uma predileção especial pelas piadas mais picantes. Todas as suas piadas eu publiquei noutro livreto, intitulado “Piadas e outras histórias de Almeidinha”, que espero publicar brevemente.
Carlos Alberto, Fortaleza

Adorei a matéria.Também estudei com D.Toinha e D.Alice, sua irmã. Aprendí a tabuada na ponta da língua e adorava a macaxeira que a mãe dela vendia na hora do recreio....Parabéns, Neuma!!!!
Sávia Ferraz, Fortaleza