domingo, 9 de março de 2014

Padre Ferreirinha, o missionário dos necessitados

Quarta-feira, dia 5 de março, início da Quaresma. Tempo de mudança, de reflexão, de renovação. Este ano o tema da Campanha da Fraternidade é “Fraternidade e Tráfico Humano”. Todo projeto de Deus tem um fundamento, uma mensagem, uma lição. Vejam o que lhes preparei para esta semana, uma história de doação, de humildade e de solidariedade. Ah! Gente de Deus é uma história verdadeira de um padre da Ordem Salesiana, que dedica todo o seu tempo livre para ajudar aos necessitados. O qualifico de benfeitor dos carentes, dos pobres e humilhados. Trata-se de padre Ferreirinha. Descobri o trabalho que desenvolve através de um amigo, seu Franciel, Ministro da Eucaristia da Paróquia do Sagrado Coração de Jesus e participante e colaborador do projeto do padre. O trabalho é muito simples, recolher lixos em ruas, praças, restaurantes etc. 
Padre Ferreirinha é alagoano, nasceu em Mata Grande no ano de 1928. Veio com seus pais residir em Juazeiro com apenas 8 anos. Antônio Ferreira Lima, seu pai, trabalhava em agricultura. Sua mãe, Maria José da Conceição Ferreira, cuidava da prole numerosa, 10 filhos; 7 mulheres e 3 homens; vivos hoje, ele e 2 irmãs. Uma irmã é freira da Ordem Salesiana e a outra, casada, reside em Crato, Ceará. Tornou-se padre em 1961, na Paróquia de Nossa Senhora Auxiliadora em São Paulo. Cursou durante 4 anos a Escola Santorium, escola de música sacra participando também do coral. Aprendeu Latim e fala fluentemente.
Passou na Amazônia 40 anos em plena selva, fazendo parte de missão salesiana. Nesse tempo ajudou a construir várias igrejas, e exerceu principalmente o papel de catequizar e evangelizar tribos indígenas. Nessa convivência aprendeu a falar vários dialetos. Como gosta de desafios, aprovou e adotou a ideia da Campanha da Fraternidade de 2011, “Fraternidade e a Vida no Planeta”. Segundo padre Ferreirinha numa conversa com Franciel, como ele se expressa, ele disse: “Padre Ferreirinha vamos ajudar a limpar essa cidade recolhendo garrafas, copos, latinhas que entopem os bueiros, esgotos e também enfeiam o lugar. E mais uma coisa, se ganha algum dinheiro vendendo o produto recolhido!” Respondi para Franciel: “O que vamos fazer com o dinheiro?”. O senhor pensa, disse Franciel. A solução encontrada logo me veio que era distribuir com os necessitados do bairro Triângulo, alimentação comprada com o dinheiro arrecadado. Esse bairro é bem conhecido por mim, pois estou lá com frequência para visitar um cunhado (viúvo de uma irmã) e que casou com outra pessoa, e essa me cativou. É muito distinta e destemida, enfrenta qualquer dificuldade, adotei-a como minha irmã. Nessas visitas descobri que este bairro é muito carente, tem muita pobreza, então, resolvi ajudar aos necessitados. A casa deles serve de ponto de apoio e distribuição. As pessoas são cadastradas e têm o dia determinado para receber os donativos, pão, arroz, feijão, pedaços de ossos para fazer caldo, farinha de milho etc. 
Para desenvolver este assunto primeiro tive uma conversa com ele, após a celebração da Santa Eucaristia, a respeito do trabalho que desenvolve junto aos pobres. Perguntei se ele permitia que abordasse este assunto. A resposta dada por ele de imediato foi “Não é coisa de bem?” Respondi: “É padre Ferreirinha”. “Pode sim”. A dificuldade foi marcar um horário. Ele muito apressado com a veste sacramental e a estola no braço, saiu rápido em direção ao Colégio. Como já fazia algum tempo que desejava falar sobre ele em minha Coluna, procurei a ajuda de duas pessoas amigas, seu Franciel, para me trazer algumas informações sobre ele, e de Valdênia, para marcar um horário para que o entrevistasse no seu local de trabalho. 
Esta conversa com padre Ferreirinha aconteceu dia 5, quarta-feira de Cinzas, em sua roça, localizada no terreno do Colégio Salesiano São João Bosco, após a quadra do Colégio. Num recanto bem simples onde ele improvisou duas pequenas tendas cobertas com lona para acomodar o material recebido e que uma boa parte ele transporta nos ombros e nas costas. Imaginem, leitores, a força de vontade e o peso dos seus 86 anos não o impedem de praticar o bem, de favorecer a pobreza. Na recepção do Colégio, me identifiquei para Marcelo, o recepcionista e ele muito solícito me levou ao encontro de padre Ferreirinha. O sol forte inundava o local de muito calor e  luz.  Ao encontrá-lo cumprimentei-o e falei: “Sou Neuma, a pessoa que Valdênia combinou o horário para conversar com o senhor”. Vestido modestamente, na cabeça um chapéu de palha e com óculos escuros para proteger-se da claridade, pois fez recentemente uma cirurgia de catarata, me recebeu, dizendo: “A senhora queria me ver aqui trabalhando, pois bem, aqui me sinto feliz, fazendo o que gosto que é cuidar de roça, de plantar milho, feijão, mandioca, jerimum, melancia. Plantei acerola, já colhi muita, ultimamente tem um bichinho fedorento que está comendo a frutinha e não dá para aproveitar”. O seu jeito de se dirigir a mim, foi muito interessante” “Olhe dona, aqui a flor do jerimum está aberta, mas um agricultor bem entendido me explicou que esta flor bonita, não é a que produz o legume, esta é macho a que fecunda é a fêmea é a flor mais acanhada”. Caminhava, parava e me mostrava os detalhes. “Este milho não tive trabalho com ele, as sementes caíram da espiga e nasceram. Cresce rápido e produz logo, é milho Ibra. O feijão também não plantei, germinou e fiquei contente. A fava não quero plantar mais rama demais e toma todo o espaço. Aqui, dona, é uma bananeira que trouxe de Recife, é banana Vinho, venho cuidando com perseverança, estava quase morta e olhe como está bonita, viçosa. Estes pés de pinha já deram boas frutas, tem um besourinho perigoso que faz a fruta apodrecer antes de completar o tempo de colher. Veja aqui, dona, neste local a planta faz muita sombra e nada vai pra frente, só mato e é onde a formiga mata a vontade, criando os formigueiros, é o reinado delas. Já colhi muito limão destes dois limoeiros, veja como o chão está forrado deles. Tem um senhor que me ajuda aqui, seu Raimundo, quando viajo. O ano passado passei três meses na região Norte, no local que dediquei quarenta anos de vida sacerdotal para me encontrar com amigos e paroquianos. Presenteei  o Colégio Salesiano de Nossa Senhora Auxiliadora com a minha sanfona de 80 baixos, gosto de tocar, e lá estava faltando uma sala de música por não ter nenhum instrumento musical, então ofereci o meu para incentivar outras pessoas para fazer o mesmo e assim levar os jovens para se dedicar à música”.
Perguntei então para ele: “Como o senhor consegue este material?” Respondeu: “Algumas pessoas me ajudam recolhendo e trazem até aqui. Outros eu mesmo recolho ou quando não dá pego um mototaxi. Este material já estou apinhando para facilitar a venda, separo garrafas, latas de leite, latinhas de cerveja e refrigerantes, vasilhames de veneno spray (eles pesam mais porque é de ferro)”. 
E o papelão, como o senhor transporta, perguntei. “Dona, empilho num feixe, amarro e coloco nos ombros”, e mostrou como fazia. “E não dói seus ombros com o peso, indaguei”. “Não sinto nada, venho do Tiro de Guerra até aqui no Salesiano, tiro dos ombros o fardo e me pergunto, como cheguei até aqui e não sinto nada doer, não machuquei os ombros e nem as costas. Na verdade dona é obra de Deus”. 
Neste momento a emoção me invadiu e as lágrimas deslizaram dos meus olhos, pois estou diante de um grande homem, pequeno na estatura, mas imenso de coração. 
Padre Ferreirinha, que Deus lhe dê muita saúde, muita saúde mesmo para dar continuidade a este projeto tão grandioso de ajudar ao próximo necessitado.
Uma Quaresma abençoada e rica das graças de Deus!    


   

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